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Qualidade do Sono na Meia-Idade: O Impacto na Saúde Cognitiva a Longo Prazo

Estudo revela que adultos que experimentam mais interrupções no sono entre os 30 e 40 anos têm o dobro de chances de desenvolver problemas cognitivos

12/02/2025

O sono é um pilar fundamental da saúde, mas sua importância para a função cerebral muitas vezes passa despercebida. Uma pesquisa publicada na Neurology, revista médica da Academia Americana de Neurologia, revelou que adultos que experimentam mais interrupções no sono entre os 30 e 40 anos têm o dobro de chances de desenvolver problemas cognitivos uma década depois. Esse estudo reforça a crescente evidência científica de que a fragmentação do sono pode impactar profundamente a memória, a capacidade de raciocínio e até aumentar o risco de doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer.

O Estudo: Como a Qualidade do Sono Foi Avaliada

No início dos anos 2000, pesquisadores acompanharam centenas de participantes para avaliar a qualidade do sono. Durante duas visitas noturnas espaçadas por cerca de um ano, os indivíduos foram monitorados por um total de seis noites cada.

Para medir a fragmentação do sono, ou seja, os despertares frequentes durante a noite, os cientistas utilizaram um dispositivo de pulso, que registrava tanto a duração total do sono quanto as interrupções e movimentos durante a noite.

Na época do estudo, a idade média dos participantes era de aproximadamente 40 anos. Uma década depois, entre 2015 e 2016, a equipe reavaliou a função cognitiva de 526 participantes por meio de entrevistas e testes padronizados que mediam:

  • Velocidade de processamento
  • Funções executivas (planejamento e tomada de decisões)
  • Memória de curto e longo prazo
  • Fluência verbal

Os resultados indicaram que, em média, os participantes dormiam cerca de seis horas por noite, sendo que 20% desse tempo era marcado por interrupções. Os indivíduos com maior fragmentação do sono apresentaram desempenho cognitivo inferior em todos os testes realizados mais de uma década depois.

Fragmentação do Sono e Declínio Cognitivo: O Que Revelaram os Dados?

Entre os 526 participantes acompanhados, os cientistas dividiram os voluntários em dois grupos:

  1. Grupo com sono mais interrompido (175 pessoas) → 44 desenvolveram dificuldades cognitivas após 10 anos.
  2. Grupo com sono menos interrompido (176 pessoas) → Apenas 10 tiveram problemas cognitivos.

Os pesquisadores também notaram que aqueles com menor duração de sono ou maior fragmentação apresentavam características em comum:

  • Maior propensão a serem homens e negros
  • Índice de Massa Corporal (IMC) mais elevado
  • Histórico de hipertensão e depressão

Apesar do número relativamente pequeno de participantes, os ajustes estatísticos indicaram que, independentemente de outros fatores de risco, indivíduos com sono mais fragmentado tinham o dobro de chances de apresentar declínio cognitivo em comparação com aqueles que dormiam de forma mais contínua.

Curiosamente, nem a quantidade total de sono, nem a percepção subjetiva da qualidade do sono dos participantes tiveram correlação direta com o declínio cognitivo. Isso sugere que a qualidade do sono, especialmente a redução das interrupções durante a noite, pode ser mais importante do que o número total de horas dormidas.

Sono e Doenças Neurodegenerativas: O Que a Ciência Já Sabe?

As descobertas desse estudo se somam a um crescente corpo de evidências que ligam distúrbios do sono ao aumento do risco de demência e outras doenças cerebrais. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) estima que cerca de 50 a 70 milhões de americanos sofrem com distúrbios do sono, como:

  • Insônia crônica
  • Apneia obstrutiva do sono
  • Síndrome das pernas inquietas

Esses problemas não apenas afetam a qualidade de vida, mas também estão associados a maior risco de diabetes, AVC, problemas cardiovasculares e até demência.

Pesquisas recentes sugerem que a falta de sono de ondas lentas (a fase mais profunda e restauradora do sono) pode prejudicar a capacidade do cérebro de eliminar toxinas, incluindo as proteínas beta-amiloide e tau, que se acumulam em doenças como o Alzheimer.

Monitoramento e Estratégias para Melhorar o Sono

A pesquisadora Leng, responsável pelo estudo, enfatiza a necessidade de aprofundar a investigação sobre como os distúrbios do sono afetam a cognição ao longo da vida. Identificar períodos críticos em que o sono exerce maior impacto sobre a função cerebral pode ser essencial para prevenir o declínio cognitivo e até retardar o desenvolvimento do Alzheimer.

Para monitorar a qualidade do sono, algumas ferramentas estão disponíveis no mercado:

  • Dispositivos vestíveis (smartwatches e pulseiras fitness, como Apple Watch e Fitbit) → Monitoram padrões de sono, mas podem ter limitações na detecção de microdespertares.
  • Eletroencefalografia (EEG) → Considerada o padrão-ouro para identificar distúrbios do sono, pois mede diretamente a atividade cerebral durante o sono.

Maggie Soltis, da Duke University, ressalta que dispositivos de consumo são úteis para observar tendências, mas não substituem avaliações médicas detalhadas. Caso uma pessoa perceba interrupções frequentes no sono, é fundamental buscar ajuda profissional para identificar e tratar a causa do problema.

Dicas para Melhorar a Qualidade do Sono e Proteger a Saúde Cerebral

Embora algumas causas da fragmentação do sono possam estar relacionadas a condições médicas, hábitos diários também desempenham um papel crucial. Algumas estratégias para promover um sono mais contínuo incluem:

  • Praticar exercícios regularmente, mas evitar treinos intensos perto da hora de dormir.
  • Evitar cafeína e bebidas alcoólicas à noite, pois podem interferir na arquitetura do sono.
  • Manter um horário fixo para dormir e acordar, regulando o relógio biológico.
  • Criar um ambiente favorável ao sono, com quarto escuro, silencioso e temperatura adequada.
  • Desenvolver uma rotina relaxante antes de dormir, como leitura ou meditação.

Como demonstrado no estudo, melhorar a qualidade do sono na meia-idade pode ser um fator crucial para manter a saúde cognitiva no futuro. Pequenas mudanças nos hábitos de sono hoje podem fazer uma grande diferença na função cerebral nas décadas seguintes.